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Seja Bem Vindo!

          Sinhôzinho ganhou este apelido quando foi fazer na Bahia um curso prático de Direito destinado a leigos e pelas frequentes viagens que fazia a Salvador. Em sua época defendeu inúmeras causas litigiosas com relação a posse de terras em favor da população pobre, pois, era conhecido como temível advogado. Há um acontecimento que podemos acentuar em sua história. Em suas terras havia muitos jumentos e alguns destes haviam sido roubados e o meliante, ao ser descoberto, tentou livrar-se da culpa dizendo ter sido efetuado o delito por ordem do Padre Gonçalo Lima, que era muito estimado em toda a região. “Sinhôzinho Bahia” acionou a força pública dando parte na polícia. Mas logo que tudo foi esclarecido a retirou. Podemos inferir que em Porto da Folha o poder público era muitas vezes acionado mesmo diante de duas personalidades poderosas e com relevante poder. A presença da polícia fazia-se notar no início do século XX, ou em outras palavras, o poder estatal era atuante e nem sempre em favor do mais forte. Entre as questões defendidas por “Sinhôzinho Bahia” foi à disputa pelas terras do héreu que o levou a enfrentar o rico fazendeiro da região Dr. Etelvino Tavares, que estava “invadindo”, ou seja, incorporando as posses de seus vizinhos às suas terras. Recorreu a Getúlio Vargas, onde enviou um telegrama de oitenta palavras sintetizando a disputa e o reconhecido direito das pessoas. Mas isso havia ocorrido quarenta anos depois do mal entendido com o Padre Gonçalo, mesmo assim demonstra a força do estado atuante na primeira metade do século XX.

          O terceiro a se enfatizar seria o Coronel João José dos Anjos, que na época do ocorrido encontrava-se em Porto da Folha com o posto de 2º Praça. Por ser tio do Coronel Eliezer Santana que tinha amizade com o Governador Leandro Maynard Maciel assumiu o Comando Geral da Polícia Militar de Sergipe. Tendo se afastado quando o Governador encerrou seu mandato, por conta disso retornou a reserva.

          O quarto e último contemporâneo de sua época foi José Gonçalves de Gouveia Lima e que na época do ocorrido teria 23 anos. Sabe-se que em nas eleições de 1935 apoiando o genro José Teixeira de Souza acabou com a hegemonia política do grupo ligado a Propriá que se compunha principalmente pelo coronelismo exercido pelas famílias Brito e Tavares. O que mais chama a atenção é que naquele ano um dito Manoel Marques, que também era candidato a prefeitura, houvera sido agredido fisicamente no Cartório da cidade. E a partir de então deixará de apoiar o grupo opositor de Propriá. Seria esse Manoel Marques o mesmo do nosso processo, sobrinho de Francisco Alves de Sá? Manoel Marques de Sá foi uma figura importante em Porto da Folha que tem hoje uma rua com seu nome devido a sua participação política.

          E o que podemos falar de Porto da Folha? Para ser breve devo salientar que Porto da Folha obteve sua emancipação política em 1835 sendo designado como Vila e em 1896 durante a Primeira República foi elevada de vila a cidade. Tendo mudado de sede entre a atual cidade cognominada primeiramente, segundo a cultura popular como “curral do buraco” e a Ilha do Ouro. Porto da Folha iria completar dez anos que havia sido elevada a cidade.

Fim do Caso

          No dia 26 de Março de 1907, em Porto da Folha estando aí reunidos para averiguar o caso os 45 (quarenta e cinco) jurados presentes, inclusive foi declarado pela justiça que se um deles se ausentasse sem motivo justificado teria que pagar 10 (dez) mil contos de réis, quantia significativa na época. O advogado do réu Luiz José de Souza Lima, o promotor público interino Bernardo Machado de Meneses Dorea, o Juiz, o oficial de justiça Antero Dantas Rio Branco. Todas as figuras estavam presentes para que o julgamento iniciasse.

          Tudo segue os procedimentos de maneira ordinária. O advogado apresenta a sua defesa e o promotor público, isto é, advogado de acusação lança os seus argumentos. O juiz de direito recebe das mãos do escrivão os processos e as questões com os pareceres respectivos do Júri, declarou a sentença em alta voz na qual o réu Francisco Alves de Sá foi condenado a vinte e dois anos e nove meses de prisão na cadeia de Aracaju. Visto o réu está em falta com do artigo duzentos e setenta e quatro do código penal. O júri entendeu que pela tamanha agressividade do réu, a legítima defesa deveria ser descartada. E o advogado depois de recorrer ao caso não conseguiu nem a inocência e nem a diminuição da pena de Francisco Alves de Sá.

Coronelismo no caso de Francisco José Alves 

          Segundo Ibarê Dantas em seu pequeno mais brilhante livro “Coronelismo e Dominação” constitui o coronelismo tendo uma tripla fundamentação. Primeiro destaca o âmbito econômico-social, uma vez que o latifundiário, isto é, o grande proprietário de terras mantém com seus trabalhadores camponeses relações de produção não capitalistas. Os trabalhadores são dependentes ao seu patrão para se sustentarem e para sua própria proteção que induz ao atrelamento ao coronel. Depois desta, existe a dimensão ideológica que nada mais é do que o controle de informações pelo senhor que se torna a cerne para preservação de padrões de dominação e manutenção da dependência pessoal dos trabalhadores. Em terceira e última dimensão temos a política. Segundo Ibarê Dantas, a participação eleitoral da população rural durante o tempo da República Velha não era tão grande assim como os livros didáticos afirmam e que muitas vezes essa participação declinou mesmo sendo o Brasil um país majoritariamente rural.  Notamos no autor certos conceitos marxistas que são usados, e nada das escolas culturais de Chartier ou Ginzburg. Deixo essa observação não para diminuir o trabalho do professor Ibarê Dantas, longe disso, ele seguia a tendência de sua época, mas para deixar avisado o leitor sobre a visão e o arcabouço teórico do autor que difere das tendências historiográficas atuais. Mesmo assim continua sendo uma obra brilhante. Ibarê Dantas não abandona a noção de que o coronelismo consistia, no campo político, uma imposição dos senhores entre as massas rurais e as oligarquias estaduais. Estas por sua vez davam suporte nas votações para Presidente. O coronelismo que “tendo como objetivo a manutenção da estrutura de dominação” (DANTAS, 1986) fazia efervescer o mandonismo local para corroer a sociedade por dentro, agindo como um câncer difícil de expurgar. Embora o coronelismo tenha aparecido no final do Segundo Império é na Primeira República que o coronelismo se expande e ganha a configuração que conhecemos hoje.

Mas por que tocar no assunto já famigerado do coronelismo no decorrente caso? A razão para tal significa a Família da vítima como as famílias Alves e Sá são famílias tradicionais em toda a região do alto sertão sergipano e que apesar do coronelismo ser exercido de maneira forte pelos Brito e pelos Tavares essas famílias também tinham suas relações de poder. Uma vez acionado o poder estatal e o réu não era uma pessoa influente e que não tinha os devidos contatos para burlar as leis da justiça. E mesmo que o réu tivesse seria difícil aplacar o descontentamento popular.

 

Conclusão

Um caso, um assassinato, um homem no decorrer de um ano. Este processo nos infere sobre a importância do poder público mesmo nas mais afastadas regiões do estado e mesmo nos locais onde o coronelismo era efervescente. Francisco Alves de Sá ao assassinar Cândido Gato estava correspondendo de uma maneira um tanto pessoal ao conflito de terras tão pujante no interior brasileiro. Lavrador, pobre e analfabeto a descrição mais correta de um homem do campo durante não só a Primeira República, mas durante boa parte do governo de Getúlio Vargas e o período que o livro didático chama de “Populismo” perpassando a ditadura militar. Não estou querendo aqui inocentá-lo, vários agentes da história toma suas escolhas distintas, mesmo vindo da mesma classe, religião ou região. O seu caso particular é de todo emblemático para entender as relações de poder no sertão e a importância que tinha a terra para quem dependia dela para viver e tirar o seu sustento ou conforto. Tal relevância não é inerente as classes sociais, pois, no sertão a ascensão se dava de maneira mais fácil naquela época.

 

Fonte

Arquivo Geral do Judiciário Arquivo Permanente/TJ/SE. Fundo: PFO. Número Geral: 3032. Subsérie: processo crime; caixa: 07;

 

Referências Bibliográficas

DANTAS, José Ibarê Costa; Coronelismo e Dominação; Editora: UFS; Aracaju, 1987.

SOUZA, Manoel Alves de; Porto da Folha : fragmentos da história e esboços biográficos; Porto da Folha, 2009.

“A História de Porto da Folha” Disponível em http://portodafolha.roxer.com/

 

 

 

 ASSASSINATO EM PORTO DA FOLHA

Data: 01 de janeiro de 1906 

 

Através deste resumo podemos observar detalhes importantes de nossa história no início do século XX.

 

O crime

          O crime ocorreu por volta das quatro horas da tarde do dia primeiro de Janeiro, no sítio denominado João Alves propriedade de José Paes da Silveira. Chegando ao sítio por volta das quatro horas, seu pai Cândido de Tal, cujo apelido era Cândido Gato, trazia consigo uma espingarda. Pouco tempo depois, logo em seguida chegou Francisco Alves de Sá. A discussão que havia começado era por conta de um desentendimento e afrontas entre Cândido Gato e Manuel Marques de Sá, sobrinho de Francisco Alves de Sá, envoltos numa disputa por terras. A discussão entre ambos chegou a tal ponto que se efervesceram os ânimos e travaram, segundo o documento, uma verdadeira “luta”, ou seja, aconteceram sérias agressões físicas. Discorrendo Francisco Alves de Sá, o réu, punhaladas sobre Cândido Gato. Embora ouvisse as súplicas do filho, José Paes da Silveira, que no momento estava presente, para que não matasse seu pai; o réu apoderou-se da espingarda e desferiu um tiro e depois várias punhaladas. Mediante tão hediondo crime a população ficou horrorizada e a força pública estadual foi então acionada e agiu prendendo Francisco Alves de Sá, que ainda se encontrava no local do crime e com as armas usadas e com a vítima ensanguentada ainda ao chão. O crime foi hediondo, Cândido Gato havia sido vítima de punhaladas, tiro de espingarda e, novamente, punhaladas. O fato chocou pela sua brutalidade e a população ficou estarrecida, embora não se demonstre durante o processo nenhum sentimento de revolta popular pedindo o sofrimento imediato do réu. Mas quem era de fato o réu?

          Francisco Alves de Sá, filho legítimo de Manuel Francisco de Sá e Maria da Conceição, ambos já falecidos. Tinha cinquenta anos de idade, era casado e tinha como ofício ser lavrador e que não sabia ler e escrever. Era tido por todos como bom pai de família. Pode-se perceber com isso que se tratava de um indivíduo da camada pobre da população, da camada menos abastada e de origem camponesa, pertencente às baixas classes de Porto da Folha.

          Em seguida os policiais do quartel de Porto da Folha o prenderam e o recolheram no cárcere. A cidade inteira entrou em pavorosa, muitos crimes foram perpetuados em Porto da Folha, mas esse causou a indignação pela sua “barbárie”, como atesta o escrivão interino Manoel Gitirana, e por se tratar da vítima não ser reincidente criminal como atesta o processo. Em seguida o delegado de polícia da cidade, Antônio José Pereira, averiguou o caso interrogando as testemunhas que foram muitas a começar por Belarmina da Silva filha da vítima, e depois todos os que estavam presentes no local. Dentre os cidadãos que serviram como testemunha, temos Eugênio Sant’Anna, Afrígio Rodrigues do Nascimento, Antônio Figueira de Souza, João Fernandes de Brito Sobrinho, Aprígio Rodrigues do Nascimento entre outros.

          É interessante notar que as testemunhas do sexo feminino não sabiam ler e escrever, sintomas da sociedade centrada no patriarcalismo, pois, não havia sentido em educar as mulheres daquele tempo. O promotor de Justiça seria Antônio Dantas Rio Branco e o juiz Miguel Alves Feitoza Filho.

          Ao averiguar melhor o caso, sobretudo analisando a possível participação de personalidades influentes da cidade e que eram contemporâneas ao ocorrido. No livro “Porto da Folha: fragmentos da História e esboços biográficos” podemos refazer parte do contexto em que o crime ocorreu e perscrutou as pessoas influentes e sua possível participação no cargo. Foram listadas quatro personalidades que tiveram forte influência em Porto da Folha e que são contemporâneas ao caso, a primeira delas é Antônio Porfírio de Britto que no ano do ocorrido tinha 22 (vinte e dois) anos. O que mais chama a atenção é que desde os 21 (vinte e um) anos de idade, Antônio Britto escrevia artigos para jornais começando com O Luctador; O Nacional; O Monitor; A Semana; O Penedo; O Norte, de Propriá; e A Idea, da cidade alagoana de Pão de Açúcar e que fica na outra margem do rio São Francisco. As únicas cópias a que tive acesso foram O Monitor que na edição de 1890 não era de sua autoria. E o A Idea de Pão de Açúcar no qual tinha uma edição sua um pouco tardia de 1914. Portanto, posso dizer que nos jornais encontrados no rico acervo do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, até o presente momento não dispomos de nenhum artigo de Antônio Porfírio Britto sobre o caso analisado.

          A outra personalidade é ainda mais emblemática e lembrada até hoje na pequena cidade, trata-se de Francisco Alves Feitosa mais conhecido como “Sinhôzinho Bahia”.